sexta-feira, 25 de junho de 2010

Ser humano sem sombra é ser humano sem luz

A palavra sombra nos assusta. Eu compreendo. Mas negá-la é como não querer admitir a própria natureza humana. Por este motivo, o estudo da sombra está dentre as observações mais relevantes de Jung a respeito da psique, a alma. A sombra para Jung é muito mais que um mero aglomerado de conteúdos indesejáveis, é o oposto complementar da luz, que só adquire sentido quando se conhece o escuro. Jung só foi capaz de perceber a realidade da sombra porque pensou o ser humano como possuidor de luz e transcendência.
E embora a sombra guarde conteúdos indesejáveis, conhecê-la e assimilá-la é vital. Quando pararmos com a infrutífera tarefa de fugir dela a todo custo, talvez possamos vê-la não mais como perseguidora, mas como uma companheira na nossa caminhada, que tem muito a nos mostrar sobre nós mesmos. E quando lhe damos ouvidos, nos damos a oportunidade de transformar o que precisa ser transformado, e deixamos de sabotar nosso próprio destino.
Mesmo que não queiramos olhá-la, a sombra está e estará sempre lá. Ainda bem! Pois ser humano sem sombra é ser humano sem luz. No mundo dos espíritos que habitam o planeta, corpos só não projetam sombra se estiverem em completa escuridão.
Assim na terra como na psique...

terça-feira, 15 de junho de 2010

Uva não tem caroço, manga não tem fiapo e gente não tem problemas.

Hoje eu estava tentando fazer meu filho experimentar um tipo diferente de uva, ele, reticente, disse que só comia se fosse sem caroço. Imediatamente me lembrei das uvas da minha infância e todas tinham caroço, e nem por isso me pareciam menos gostosas que hoje em dia, assim como as fiapentas Mangas Carlotinhas que eu tirava diretamente do pé e enchiam os meus dentes de fiapo, o que incentivava o uso do fio dental. Dava trabalho sim, mas e daí? Era aproveitar a vida e a natureza com tudo o seu sabor, sabendo lidar com o que vinha junto. Afinal de contas, uma das coisas mais belas nas frutas é o fato de conterem sementes, o que as faz parte de um ciclo completo de morte / renascimento e renovação.
Hoje em dia existem os produtos transgênicos, que não dão sementes, e as frutas são alteradas de tal forma a perderem as suas principais características, importando apenas o consumo em si, sem conexão alguma com a natureza. Já não nos basta não colhermos a fruta do pé, mas sim da gôndola dos supermercados, agora as frutas são semi mortas mesmo, já não carregam dentro de si a vida. Como uma mulher estéril apenas destinada a ser uma gostosona a ser consumida por ávidos olhares masculinos. Ela não pode gerar, pois podem ficar as estrias, e se geram têm medo de amamentar, pois os seios podem cair...
As pessoas não podem mais vivenciar tristezas que as fazem crescer, para isso temos antidepressivos cada vez mais poderosos. E principalmente os relacionamentos tem que ser perfeitos, como em um comercial de televisão ou a capa da revista de fofocas, sendo abandonados no primeiro obstáculo. Afinal de contas, acha-se outro em qualquer esquina mesmo, nas gôndolas das casas noturnas, no consumismo descontrolado dos ficantes de uma noite.
Mas lembrem-se: Uvas sem caroço e mangas sem fiapos costumam ter pouco sabor e também podem estar podres por dentro.

terça-feira, 1 de junho de 2010

A ilusão da imparcialidade.

Existem momentos em que eu gostaria de acreditar que o lugar do psicólogo é o da tão almejada imparcialidade. Seria muito fácil crer que em terapias nas quais nos posicionemos apenas como ouvintes meneando a cabeça de vez em quando ajudassem alguém. Obviamente um psicoterapeuta não está no lugar de dizer ao paciente o que deve ou não ser feito, mas isso é bem diferente de não se colocar de forma mais clara frente a questões que realmente farão diferença na vida de alguém. E isso faz com que a responsabilidade do tratamento, da profissão escolhida se apresente com toda a sua beleza e todos os seus riscos, sem floreios, sem a ilusão, sem aquela peneira da imparcialidade na qual alguns costumam se esconder quando o calor do sol aumenta muito.

Como dizia o velho Jung, o relacionamento de duas psiques, de dois seres humanos, é o que move a terapia.