domingo, 19 de fevereiro de 2017

Mensagens conflitantes para mulheres de hoje.

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Se você  é ao menos um pouco reflexiva, continue a ler pois sei que vai me desculpar o jeito e compreenderá onde quero chegar. Porém, se não é esse o seu caso, deixa para lá, poderemos falar de outras coisas outro dia.
Tudo começou há algum tempo atrás numa divertida e despretensiosa roda de amigas entre 35 e 40 anos de idade. Modéstia parte, todas dispostas, saudáveis e bem aparentadas. Eis que chega mais uma e começa dizendo “Gente, li uma matéria a respeito de gestação muito interessante. ” Capturou nossa atenção, “Começava assim: A gravidez em mulheres idosa- abre parêntesis, a partir de 35 anos...” Todas começamos a rir. Era um fato, estávamos todas “passadas”. Pelo relógio da liberação de óvulos éramos idosas e nenhuma de nós se sentia assim. Embora fosse engraçado, alguns segundos depois comecei a intuir naquilo uma aura velada de humor negro. Não sei se elas pensaram a respeito disso, mas talvez nós só tivéssemos a capacidade de rir por já sermos todas mães. Era riso de nervoso, talvez alívio? Não sei ao certo. Mas nunca esqueci aquele dia.
Bem, há poucos meses senti aquela aura novamente.  Eis que de poucos meses para cá algumas pacientes minhas com 30 ou 30 e poucos anos de idade, sem filhos, solteiras ou casadas- e absolutamente lindas e inteligentes diga-se de passagem - receberam o sábio conselho de uma grande amiga preocupada. “Fulana, vou te perguntar uma coisa, você pensa realmente em ter filhos algum dia? ” “Sim, pretendo, faz parte dos meus planos ter uma família” “Então acho bom você pensar seriamente em congelar seus óvulos, porque sabe como é, você está com 30 anos, ainda não tem nem namorado – ou seu casamento não vai durar, ou não se sustenta ainda – e sabe como é, a partir dos 30 os óvulos já não são mais a mesma coisa né, envelhecem. ” Ri muito com elas para dispersar o peso imenso que lhes foi jogado nos ombros, ou melhor seria sobre o útero, pela mensagem de fracasso embutida no sábio conselho. Ri, mas era de chorar. Sei que é verdade, óvulos de fato envelhecem, porém, várias amigas minhas geraram filhos saudáveis após os 40. Mas a pressão neurótica exercida sobre essas mulheres de 30 (nós todas?) por todos os lados com abundantes mensagens dúbias e contrárias exercidas pela mídia a pela própria indústria médica são de fato muito cruéis. São mulheres que tentaram fazer tudo “certinho” como manda o figurino, ou os diversos figurinos, e se viram em um limbo em que os mesmos não lhe ofereciam uma roupa adequada para vestir.
Há um descompasso cada vez maior entre o que é oferecido e exigido das mulheres hoje tanto em termos emocionais quanto profissionais e o que se espera de nossa biologia. Alguém que tem filhos entre 18 e 25 anos é vista como tendo tido uma gravidez precoce e depois dos 30 tardia. Gerar deixou de ser um processo natural e virou algo a ser evitado a todo custo, “evite, pois, acabará com a sua vida” para depois passar rapidamente do status de idealizado e romantizado do processo para o “corre ou não vai dar tempo”.
Isso faz com que a fase entre 26 e 30 anos seja uma gincana absurda, dentro dos quais há de cumprir tarefas como: ter uma carreira de sucesso, uma barriga sarada, fazer bonito no tubinho, arrumar um relacionamento estável com um homem que com certeza será um bom pai, e ainda ter se resolvido psicologicamente com os próprios pais, para ter todos os filhos antes que os óvulos percam o prazo de validade. E tudo isso exorcizando o fantasma da demissão pós licença maternidade. Pois sabe como é, depois que se chega aos 35 nem sempre é fácil, as empresas estão contratando pessoas jovens, e se sair para depois se recolocar... Meu Deus, não dá tempo de terminar todas as pós-graduações exigidas pelo mercado sem estar idosa.
Mas como assim idosa? Estamos de fato cada vez mais bonitas, saudáveis e saradas até bem depois dos 40, de forma que nem era imaginada por nossas avós.
Tudo graças a imensa oferta de uma diversidade de alternativas a gosto do freguês. Alimentos funcionais, orgânicos, crenes de beleza, filtro solar, vitaminas, yoga, academia, hormônios sintéticos ou isoflavona de soja (mesmo sendo transgênica, fazer o quê...), Botox, preenchimento, silicone e lipoaspiração! Sem falar de uma qualidade espetacular que as tintas para cabelo têm hoje em dia.  Viva a evolução química e médica!
Atrás da mensagem de saúde, a promessa implícita de todo aquele avanço da medicina é, forever jung! Porém, eis que a mesma avança ferozmente sobre as mesmas “jovens” com a oferta quase opressora de que é bom congelar os óvulos até os 30. E o que dizer daquelas que acreditando na promessa do elixir imaginam que aos 30 ainda são adolescentes? E que de jovens passam a idosas pela simples leitura de um panfleto promocional de uma clínica que oferece o lucrativo serviço de congelamento de óvulos!
Não, isso não é justo!  Médicas entram na faculdade aos 19 anos só viram especialistas aos 30, 31 anos, as advogadas jornalistas e publicitárias têm rotinas frenéticas de escritórios que não dormem e não pagam hora extra, as professoras em uma semana lecionam para mais de 500 alunos em 5 escolas diferentes atravessando a cidade em transportes precários e engarrafamentos. Como fazer isso tudo e criar filhos saudáveis sem carências psicológicas? E quando quando não se tem uma mãe presente, ou um marido que assume as responsabilidades que lhe cabem – nem pense na palavra ajuda para isso, chega a ser infame – ou muito dinheiro para pagar uma boa creche aliado a uma grande resistência a culpa de estar abandonando os filhos. Ficar em casa nem pensar, a crise econômica está rondando a porta, depender de marido é inviável, muitos não são confiáveis, e mesmo que sejam hoje em dia não fica bem, o que os outros vão dizer?
Então o que é ter 30 anos de idade? O que é ter 40, 50, 60.... O que é ser mulher, qual o propósito do tempo, o que é viver, onde mora o espírito?

Me perdoem, mas em muitos casos fazer as perguntas leva mais longe do que encontrar as respostas prontas.


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